domingo, 7 de agosto de 2011

Devon

            A Sarah foi uma grande amiga para mim. Eu nunca vou esquecer toda a diversão que nós tivemos juntos. Eu lembro com felicidade de muitas das coisas que mais sinto e vou continuar sentindo falta, a respeito dela.
            Eu sinto falta de como ela me fazia rir das coisas mais bobas, como quando ela ficava sem graça de ter que interagir com as outras pessoas. Eu vou sentir falta de quando eu a via arrumada, já que 99% das vezes que eu encontrei com ela foram numa praia. Eu vou sentir falta, especialmente, de quando ela se arrumava para comer em uma lanchonete ou para ir ao jardim botânico, como se a gente estivesse indo em uma ópera, porque ela sabia que as próximas 100 vezes que a gente se visse, ela ia ter que estar usando chinelo de dedo, short e uma camiseta cheia de areia.
            Eu vou sentir falta de discutir com você coisas simples como livros e filmes e todas as coisas que acontecem neles e que dificilmente acontecem na vida real, como amigos de infância crescerem juntos e se casarem.
            Eu vou sentir falta de como você comia batata com sorvete, apesar de eu achar nojento. Eu vou sentir falta de como você apertava os olhos quando um caminhão ou um ônibus passava perto de você (eu sempre achei isso tão esquisito). Eu vou sentir falta das nossas discussões sobre tudo, especialmente sobre a vida um do outro. Eu vou sentir falta do seu rosto, do seu sorriso, dos seus olhos e de tudo que era tão maravilhoso pra mim.
            Mas, mais do que tudo, vou sentir falta da minha amiga, Sarah, que foi tão importante para mim. De tudo que experimentamos juntos, bom ou ruim, mas que nos fez tornar mais próximos. Você era linda, encantadora, engraçada e irritante, e eu vou sentir falta de tudo em você.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

"aknowledgements"

            Quando nós terminamos um evento, uma palestra, uma formatura, nós geralmente temos uma sessão de agradecimento às pessoas que tornaram aquele evento possível, que fizeram daquela noite ou daquele dia um sucesso. Eu gostaria de fazer uma sessão de agradecimentos para a pessoa que tornou da minha vida um sucesso. A minha melhor amiga e a pessoa que mais me influenciou ao longo da minha vida.
            Ela foi a pessoa que mais me ensinou. Me ensinou coisas que poucas pessoas que eu conheço entendem. Ela foi a pessoa que, até hoje, me faz perceber detalhes novos sobre a nossa jornada juntos. Uma jornada que pode ter sido longa ou curta dependendo dos olhos de quem vê.
            Desde que eu a conheci, ela me vigiou e cuidou de mim. Sempre que eu me sentia mal, ela levantava meu espírito e sempre que eu pegava chuva ela me olhava torto com aquele olhar de mãe coruja. Não importava se ela tinha pegado chuva também ou se a culpa não tivesse sido minha, ela sempre me repreendia pelo risco de ficar doente.
            Toda sexta ela me perguntava sobre os planos pra sábado e toda segunda ela me perguntava como tinha sido o domingo, mesmo quando nós passávamos o fim de semana todo juntos. Todos os dias pares, eu chegava na praia e encontrava ela sentada olhando o mar, e ela me contava histórias sobre o dia dela e sobre o que ela fazia e no que pensava ou o que planejava para o futuro.
            Ao longo dos anos, eu devo ter ouvido centenas de histórias desse tipo. As histórias da Sarah, histórias sobre uma filha exemplar, uma boa irmã e uma pessoa maravilhosa. Histórias que eu vou guardar e lembrar até o fim da vida e das quais eu sempre irei sentir falta.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

All we have

            Em um momento de perda, às vezes é difícil conseguir as palavras apropriadas. Desde a composição de um tributo até a hora de demonstrar o carinho pelos que perdemos, as palavras sempre acabam nos faltando.
            Ainda assim, existem coisas que nós podemos falar. Fatos, coisas que não precisam de um texto elaborado, não precisam de um discurso tocante e que nunca deixam de ser verdade. Eu gostaria de dizer algumas palavras sobre a Sarah:

            - Ela era uma boa pessoa, ela amava a vida, o mar e a música.
            - Ela era divertida e tinha aquele jeito que ainda me faz ter vontade de sorrir, mesmo depois de tanto tempo.
            - O sorriso dela era raro, mas lindo.
            - Ela não tinha um lado espiritual ou religioso, mas tinha valores fortes que ela conseguia passar pra qualquer um e que eu gostaria de conseguir passar para os outros também.

domingo, 10 de julho de 2011

As coisas que Sarah disse.

            Ela estava linda aquele dia. O cabelo estava longo e o rosto estava iluminado. Ela estava como no dia do aniversário de 15 anos.  Ela estava se despedindo do lugar em que havia nascido e passado os seus quase 16 anos; andando de um lado pro outro, tentando não expressar a tristeza inocente dela. Ela me deu um abraço e um “eu te amo”.

“Eu também te amo, por que você está tão triste?”
“É muito bonito aqui, eu não quero ir embora.”

domingo, 19 de junho de 2011

Férias

Lá fora, no então chamado "mundo real", para os olhos mal-acostumados, eu e Sarah éramos apenas bons amigos. Eu era o falante e ela era a calada e nós éramos apenas amigos como tantos outros, e em todos os meios oficiais e apropriados, assim permanecemos - do início ao fim.

Porém, neste mundo real, no território localizado muito mais próximo da verdade, nossos papéis na vida um do outro não eram tão facilmente definidos. Às vezes eu era um terapeuta e ela uma cliente, às vezes ela era uma professora, e eu um estudante, às vezes o contrário. Mas, na maioria das vezes, nós éramos companheiros de turma, e a nossa amizade era a professora.

Em alguns momentos após ela se mudar, eu sentia como se eu tivesse largado pra trás o meu país e minha vida, e não ela. E houve momentos após a morte dela em que eu é que parecia ter perdido a vida, e até hoje  não perco a sensação de que, assim como ela, eu tive que encarar a morte, mesmo que por outro ângulo,  pelo lado de fora. Talvez essa tenha sido a troca de experiência mais importante, de tantas outras, que tivemos. Mesmo após morrer, ela continua me ensinando como viver.

Conforme o "período de aulas" acabou, eu sentia cada vez mais saudades da minha amiga, da minha companheira, da minha estudante, professora e terapeuta. Dois dias antes da viagem dela, nós trocamos presentes. Livros. E tivemos nossa última aula, ou sessão, no portão do aeroporto. Eu me sentei perto dela, dividindo um fone de ouvido que acabou se tornando nossa maior forma de se conectar, depois que o assunto morria. Eu perguntei como ela se sentia, e ela simplesmente disse "triste", e sorriu (provavelmente o máximo que ela podia). Ela me lembrou que ainda tinha coisas dela comigo, e que eu tinha que devolver no ano seguinte, e sorriu um pouco mais do que antes. O vôo ia partir, nós nos beijamos e nos despedimos.

A idéia de ver a Sarah de novo era certa, mas após a morte dela, as coisas mudaram muito, até um certo ponto onde eu mesmo percebi o quanto eu tinha mudado com o acontecimento. Eu não sei dizer exatamente quando eu me dei conta disso, mas eu posso levar você para o lugar exato. No Jardim Botânico, uma epifania concisa: "eu mudei". Você pode dizer que para uma "epifania", não foi exatamente um clímax ou uma revelação, mas não importa. O trabalho estava feito e a lição estava aprendida. Eu sabia que, quando chegasse a hora, quando eu tivesse superado tudo e precisasse mudar de novo, eu poderia. Porque a Sarah havia me ensinado como.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Quatro anos depois

           Este domingo foi o aniversário de quatro anos da morte da Sarah. Eu mal posso acreditar que já passou tanto tempo, mas os calendários que mudaram e as estações que passaram me lembram de que é verdade. Eu, mais uma vez, me encontrei na pedra do Leme, ontem. Eu olhei para o mar, através das ondas e assisti o sol descendo por trás do horizonte, enquanto refletia sobre as pessoas que conheci e as coisas que aconteceram nestes 4 anos. Houve momentos de lágrimas derramadas e tantas memórias para se reviver e se abraçar. Houve felicidade, nas lembranças de sorrisos compartilhados, e um sentimento enorme de perda que parece nunca ir embora.
            Eu toquei a pedra, sem me tocar do que estava fazendo, e parecia quente, apesar do vento frio que que vinha da praia. Enquanto me voltava de novo para o mar, me lembrei de todas as centenas de dias que ela tinha passado ali, mas hoje não havia sinal da presença dela em lugar algum. Eu sentei sozinho, pensando nos dias em que eu nunca teria me imaginado nessa situação: ali, sozinho.
            Involuntariamente, eu me levanto e penso na saudade. Eu viro de costas para o mar, e começo a ir embora devagar, mas as minhas pernas parecem muito pesadas e com vontade de não sair dali. Eu continuo andando e o som do mar diminui e desaparece, eventualmente. Eu sinto a indecisão entre voltar correndo para lá ou voltar correndo para casa pra poder deitar. Por último, eu me pergunto se o próximo ano também será assim e o ano seguinte, enquanto uma mistura de memórias que dão vontade de sorrir e memórias que me enchem de tristeza me lembra que eu já sei a resposta.